sexta-feira, maio 24, 2024

 




Naquela manhã de domingo, no fim da atividade com as crianças, uma menina chegou bem pertinho de mim e baixinho disse: ‘Tia, eu não gosto do meu pai, ele é cachaceiro’. Surpreendida por sua declaração, passei os braços em volta dela e respondi que iria orar para que o papai deixasse de beber. Também, prometi que visitaria a sua casa. Ela assentiu com seus olhos tristes e foi embora.

Meu coração apertado ficou. Nossas crianças estão sofrendo. Os campos brancos para ceifa, estão tão perto de nós como aquela menina esteve de mim.

Mas, parece que não queremos erguer os olhos. Ver pode incomodar. Ver pode nos trazer compaixão. Ver pode nos fazer querer ser a resposta.

Em meio à minha angústia, lembrei de Isaías. Creio que ele viu os campos quando Deus perguntou a quem enviaria. Ele quis ir. Ele entendeu a grandeza da missão. Ele não deu desculpas do tempo, do trabalho, da família, dos projetos pessoais. Ele se dispôs a deixar a sua agenda. Ele quis ser a resposta para sua geração. Ele não tinha toda a revelação que já temos do reino, mas, com o que sabia, compreendeu que valia a pena perder a vida por amor ao seu Senhor.

Hoje, perdemos a noção de quem é o Senhor. Falamos que é Jesus quem manda, contudo, vivemos a vida que queremos, e não a que Ele propôs em sua palavra. E ainda nos enganamos, pensando que Ele aceita que vivamos de cabeça baixa, olhando só para o nosso campo...

A verdade, é que muitas crianças seguem como aquela menina de olhos tristes, esperando que a igreja se levante e leve a única palavra que pode dar esperança. E Jesus, não nos aceitará de mãos vazias.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga clínica

 

 

sexta-feira, maio 17, 2024

As pessoas têm inveja de mim?

 


Este é um assunto que não penso muito. Na verdade, gosto da minha vida, porém, sei que ela é muito simples, e não parece fazer sentido que alguém tenha inveja da forma que vivo.

Mas, conheço pessoas que tem receio da inveja. Elas não contam nada para ninguém, por medo que alguém as inveje, e seus planos sejam destruídos. Respeito quem pensa assim, porém, eu não creio nisso.

Diz um grande historiador que a inveja é um pecado envergonhado, logo, ninguém confessa que sente do outro. Na minha observação, nos meios em que convivo, percebo ser uma verdade, pois nunca ouvi alguém admitir que sentiu inveja de alguém. Eu mesma, nunca achei que senti.

Pensando sobre a inveja, cheguei à conclusão que o conceito não era muito claro para mim. Então, fui estudar. Fiquei assombrada com a quantidade de material sobre o assunto. Dentre eles, gostei deste resumo: todas às vezes que nos comparamos com alguém e nos sentimos diminuídos, a inveja ocorre. Também, ela é uma dor que nasce quando olhamos para a nossa vida e sentimos que algo está nos faltando.

Uau! Pensando apenas neste resumo... E lembrando-me de Eva que tinha tudo no Éden e ainda caiu no conto da serpente que algo lhe faltava... Senti um nó na garganta.

Sempre acho difícil avaliar a mim mesma. Dói mais do que avaliar outras pessoas. Contudo, cheguei à conclusão que, com a comparação, não tenho muito problema, já estou numa fase da vida em que sei que só posso me avaliar a partir da minha própria história. Mas, quanto ao que falta, vi que por vezes sinto dor, por não ter condição de fazer o que acho que seria necessário. Fiquei chateada. Que descoberta desagradável! Eu, que pensava não sentir nenhuma inveja.

Buscando direção para saber o que fazer com que descobri, voltei meus olhos novamente para o Gênesis, na busca de entender o que ocorreu com Eva, ao comer do único fruto, não permitido no Jardim.

Fiquei me perguntando como alguém com a vida perfeita e plena de alegria, morando num belo jardim, visitado por Deus no fim do dia e sem problema de relacionamento com Adão, deseja a única coisa que não pode ter? Como não foi capaz de avaliar que em sua vida nada faltava?

Sei que somos guardados por mistérios e só conheceremos como somos conhecidos, no futuro. Todavia, o texto traz uma verdade bem clara. A serpente em sua estratégia levou Eva a tirar os olhos de Deus, e voltar o seu olhar, para si mesma. Neste instante, desejou a única coisa que não tinha (e jamais poderia ter), o ser igual a Deus. E ao desobedecer comendo do fruto, é como se dissesse para Deus que tudo que recebeu não era tão bom assim, e, que tinha o direito de ser igual a Deus. Ao pensar assim, deixou de dar glória a Deus, propósito para o qual foi criada. Neste instante, creio, nasceu a inveja.

Que tragédia!!!

Por alguns momentos, minha alma ficou perturbada... Fui me dando conta que todas às vezes que eu volto os olhos para mim e vejo o que me falta, desejo o que não tenho, e alimento a inveja que já vive dentro de mim. E quando isso ocorre, sem temor, e nem sempre com palavras, falo para Deus que desconsidero o dom da vida, a saúde que tenho, a minha imagem no espelho, os recursos e trabalhos, as pessoas ao meu lado.

Que perigo! A inveja tem raiz profunda.

O escritor de Eclesiastes tem razão, “a inveja é a podridão dos ossos”2, porque me faz focar no que não tenho. Ela tem o poder de tirar os meus olhos de todo o bem recebido. Sem ver o que já tenho, deixo de louvar e agradecer a Deus, tornando-me amarga. E ao carregar o fardo da amargura, cala em mim, toda glória devida a Deus. Neste instante, deixo de cumprir o propósito para o qual fui criada.

Que tragédia!!!

Descubro que dar glória a Deus não é apenas falar algumas palavras de louvor em uma oração. É mais profundo. É uma postura diante da vida. É me dar conta que tenho muito mais que julgo merecer. É crer de verdade que não tenho, diante dEle, nenhum direito para reivindicar.

O caminho não me parece fácil. 

Todavia, percebo que viver sem dar glória a Deus é ficar e manter-me doente em todas as dimensões da vida. Meu coração não encontra âncoras. Sem a clareza do cuidado pleno de Deus em minha vida, sou capaz de mergulhar fundo nas águas da ansiedade e angústia. E até mesmo, o mais leve vento, pode abalar-me.

Então, decido que vale a pena a jornada na certeza que Deus fez tudo certo. Nada está atrasado. Mesmo agora, fora do jardim e vivendo os embates das relações humanas, Deus em Cristo, me abençoa com toda sorte de bênçãos3, e, me permite entrar em Sua Presença, onde pode posso buscar todo suprimento para a falta que o pecado gerou mim4.

Quanta graça. É mesmo um rio de águas vivas, a trazer o jardim de volta, por onde corre dentro de mim.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga

Referência bíblicas:

1. Gênesis 3;

2. Provérbios 14:30;

3. Efésios 1:3;

4. Hebreus 4:16.

quarta-feira, maio 08, 2024

É difícil ficar numa rua sem saída

 


Você já conviveu com uma pessoa que te faz sentir que está numa rua sem saída? E ainda que disponha de tudo o que está ao seu alcance, ela nada aceita. Você vê as soluções, mas, ela resiste com toda a força a tudo que pode ajudá-la. E mesmo sofrendo, se apega às suas escolhas, como se fosse a causa de sua vida.

Quem está do lado fica com a sensação que a morte as espreita... Ela parece beber do veneno do suicídio em doses homeopáticas. E como é difícil respeitar, nela, o acelerar a morte... Não é fácil compreender o que as faz resistir, ao que lhes daria alívio.

Por vezes, queremos salvá-las. Logo, descobrimos que a missão é impossível. Sem conseguir, muitas pessoas, desesperam. Outras tantas adoecem junto. Não é fácil não ver luz no fim do túnel.

Por vezes, a raiva brota. A teimosia de quem não quer ajuda, não nos poupa de problemas que poderiam ser evitados ou minimizados. E nos vemos muitas vezes forçados a andar com os pés quebrados. Meu Deus, como dói cada passo.

Fico tentada a pensar que, quando uma pessoa decide por caminhos de morte, o que mais as motiva é o egoísmo na sua dimensão mais profunda. Pergunto: Ela deixou de amar aqueles que estenderam suas mãos na sua direção? Ela não considera tudo o que está sendo feito? Não entendo. O egoísmo tira a visão de quem está do lado. E não ser visto, é não ser amado, e sem amor a vida fica tão sem beleza...

Será que nos resta apenas sentar no meio-fio, nesta rua sem saída, sob o peso do cansaço da impotência?

Não! Graças a Deus, não!

Jesus nos convida, nesta rua sem saída, a olhar para cima (Mateus 6:28,29). Quem olha para cima verá o estilista da esperança. Aquele que veste os lírios dos campos com as mais finas roupas. E das ruas sem saídas, Ele faz seu ateliê, nos tornando, dia a dia, mais parecidos com Jesus. Quanta beleza!

Também, Jesus entende o que é morrer por quem só escolhe o pior. Ele voluntariamente se entregou por mim e você. Ele nos ensina que o peso de tentar entender as pessoas é maior do que o peso de simplesmente amá-las.

Que Ele nos ajude.

Roseli de Araújo 

Escritora e Psicóloga

quarta-feira, maio 01, 2024

Um amigo preso, mas livre. Como?

https://www.jusbrasil.com.br/artigos/voce-ja-foi-a-um-presidio-um-relato-da-minha-primeira-experiencia-em-um-presidio/311734612


Tenho um amigo, que vou chamar de António, nome fictício, que foi preso sem ter cometido o crime o qual foi acusado. Foi absolvido na primeira instância por falta de provas. Porém, o advogado de acusação recorreu, e o seu advogado perdeu o tempo da defesa, e ele foi sentenciado a mais de 9 anos de prisão.

Ao saber vivi um misto de raiva e tristeza pela injustiça. Pois, de todos os ambientes que julgo terrível, presídio me parece um dos mais tenebrosos.

Um dia orando pela sua vida e de sua esposa, senti em meu coração que deveria escrever para ele. E assim fiz. Ele me respondeu por meio da sua esposa. 

Ao ler sua carta fiquei surpreendida e, ao mesmo tempo, envergonhada. Pensei que encontraria alguém amargurado e emocionalmente quebrado. Mas, veja o que ele me respondeu: 

'Como amei sua carta, é como degustar de uma comida refinada que alimenta a alma... E as palavras são como abraços que faz sentir o afeto e o carinho de uma amizade tão sincera que constrange o coração. Poder me comunicar com você e seu marido é um privilégio incomparável. Aqui o deserto de afeto e carinho é tão grande que receber uma carta, uma visita, tem grande significado, que não tenho palavras para expressar. Aqui é Deus que faz a diferença cada dia me fortalecendo para enfrentar o dia a dia e vencer, sem desfalecer na alma. Sei que tudo isso vai passar, e só vai restar o testemunho dos cuidados de Deus. Depois de tudo que vivi com Deus e presenciei, a minha fé está firmada e minha alma convicta que no final é vitória em nome de Jesus Cristo. E todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus e são chamados segundo o seu propósito. E os propósitos de Deus são sempre para melhor e nunca para pior, ainda que hoje não entendemos, o amanhã vai trazer clareza, e vamos glorificar a Deus´.

Meus queridos amigos, estas são as palavras de um homem preso injustamente.

Ele segue: `As palavras que eu falo não são palavras ao vento, mas que sai do coração. O salmista diz no salmo 45 que de boas palavras transborda o meu coração e a minha língua é a pena de um habilidoso escritor. E a bíblia diz que a boca fala do que o coração está cheio. Minha irmã, em breve estaremos juntos, para glória de Deus.  Que Deus abençoe você e seu marido e continue acrescentando em suas vidas. A única coisa que eu posso falar é gratidão. A minha saúde esta estável e estou passando por um cardiologista que é muito bom, e esta me dando toda atenção. O pior já passou, em nome de Jesus estou caminhando para vitória e reta final`. Ao finalizar a carta me pediu para dar atenção para sua esposa.

Sua esposa me contou que ele não para de pregar no presídio. Lá, tem ganhado muitos homens para Jesus. 

Fico muito impressionada com sua postura. Ele não se sente vítima, mesmo sendo. Ele compreendeu quem é o Senhor da sua vida. Ele creu na soberania divina. E seu coração encontrou descanso em Deus.

Ao terminar de ler sua carta fiquei constrangida. Ela expôs minha fé. No primeiro momento, eu quis acreditar que Deus escolhe gente para ser mais espiritual. Mas, sei que isso não é verdade. A Palavra e o Espírito Santo foram dados a igreja - eu e você - que cremos em Jesus.

Somos nós que não vivemos a radicalidade da nossa fé, porque preferimos viver um evangelho customizado (customizar é fazer com que algo fique do jeito que a gente deseja). Um evangelho que obedecemos só o que nos interessa. Um evangelho de orações onde nossa busca é obter de Deus, o favor. Um evangelho sem cruz, onde não abrimos não de nada para servirmos ao Senhor, e ainda apresentamos nossas desculpas do trabalho, da família, e de tantas outras coisas... Hoje não temos tempo nem para ler a Palavra e a oração sempre pode esperar, (nem mesmo no domingo, nosso dia reservado para o Senhor).

E por isto, quando o sofrimento chega a nós, reclamamos. Ficamos ressentidos com o não de Deus. Falamos que Jesus é o Senhor, mas, por Ele, queremos ser o tempo todo servidos...

E por isto, nossa alma está sobrecarregada, ainda que Ele nos convide a vir até ele, para aprendermos a ter coração manso e humilde, e assim encontrarmos descanso para nossa alma. Nós preferimos carregar o fardo de termos direitos e do orgulho.

Li e reli sua carta. E minha conclusão é que meu amigo que está preso esta muito mais livre que eu e muitos irmãos amargurados e cansados que cruzo pelo caminho.

O meu amigo se rendeu ao Salvador e Senhor da sua vida. Ele desfruta de uma riqueza que riqueza nenhuma pode comprar. Ele tem paz e descanso. Suas cadeias não foram capazes de torná-lo, mais ou menos feliz. Ele descobriu que a paz e alegria não está na sua liberdade, no seu casamento, nos seus filhos, no seu trabalho, nos seus amigos, nos seus estudos. Ele compreendeu que tudo que precisa está tão somente em Deus.

Meu amigo preso esta livre como eu desejo esta.

E você?

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga clínica

(62) 982385297