quarta-feira, maio 30, 2018

Perdoar é preciso?(x)


Hoje é quarta. Fim de viagem. Últimas considerações sobre o tema perdão.


Perdoar é uma viagem cujo item principal da bagagem é a sabedoria, talvez por isto, as pesquisas apontam que os idosos perdoam mais que os adultos, e estes mais que os adolescentes1, mostrando que a sabedoria adquirida ao longo do tempo vivido pode ajudar na arte de perdoar2. E seja homem ou mulher, não há diferença, todos enfrentam as mesmas dificuldades na estrada da vida quando é preciso viajar com o destino ao perdão3.
Esta viagem é uma escolha que na maioria das vezes não brotará de forma natural no coração. Entretanto, os viajantes que decidiram fazê-la nos garantem que da mesma maneira como aprendemos um caminho para chegar a um destino, o perdoar também se aprende. Eles também nos apontam certos itens que não podem faltar na bagagem daqueles que decidem empreender tal viagem. Eis aí quais são eles:
Primeiro, a calma. Vá para um lugar aberto, um parque, um jardim, o quintal da casa, a área social do condomínio e sente-se sob uma árvore. Deixe a sombra refrescar você, até que a raiva se abrande no coração. Se for preciso e houver grama, ande descalço por pelo menos 20 minutos. Mais calmo, tente pensar se a pessoa lhe machucou intencionalmente, se estava submetida a uma pressão interna ou externa que a tirou do controle, se tentou reparar a atitude que produziu mágoa. Pense sobre a história que viveram juntos, quantas vezes já teve que perdoar e também ser perdoado. No calor da ira, jamais converse com quem te machucou.
Segundo, aceitar a raiva. É importante a compreensão de que negar a raiva provocada por uma afronta só faz com que ela cresça. Experimentar sentimentos ruins é algo do universo humano, o qual tem que ser reconhecido por aquele que sente. Tão ruim quanto negar, é engolir. O estomago emocional não aguenta por muito tempo o mal-estar, e vomitará no corpo muitos sintomas, dentre eles, a ansiedade e a depressão.
Terceiro, a humildade. Se perceber que não consegue sozinho, dê a si mesmo a permissão para falar sobre o assunto com alguém imparcial e que confie, seja um amigo, um parente, o seu líder na igreja ou um psicoterapeuta. Ninguém é forte demais ou espiritualmente raquítico porque em um determinado momento da vida precisou de ajuda. Por vezes, árvores frondosas caem no meio da estrada, e só com ajuda podemos removê-las. Da mesma forma, todos os seres humanos passam por trechos complicados ao longo da vida, na qual buscar ajuda será o único jeito de seguir a viagem. É triste ver gente parada por não ter tal item na bagagem, a humildade.
Quarto, instrumentos de liberação da tensão. Certas atitudes podem trazer  alívio ao corpo e a alma, como por exemplo: ouvir uma história de perdão; ouvir uma música que gosta; ter uma caneta, um papel ou uma tela a punho para escrever ou pintar o que sente; os passos de uma dança a movimentar o corpo; bordar, fazer móveis, cantar, fazer exercícios físicos e tantas outras coisas...
Na verdade, qualquer hobby vai ajudar. E para quem não tem é urgente encontrar um passatempo que lhe produza relaxamento, pois é necessário diminuir o peso da tensão sentida para prosseguir nesta viagem rumo ao perdão.
Os viajantes que chegaram ao destino do perdão ensinam que a vingança é um item que não deve ser levado na bagagem. Dizem que “vingança é um prato que se come frio”, entretanto, ela é muito mais que isto, porque comida fria pode ser apetitosa ao paladar de alguém. Porém, a vingança é o fermento do ódio, a fazer crescer o aumento da pressão arterial, da ansiedade, da depressão, a todos, indistintamente que decidirem mantê-la. Gastar tempo em vingar uma pessoa que lhe produziu uma mágoa, é o pior investimento que pode ser dado ao tempo, uma vez que tempo é recurso que não se sabe o quanto se têm.  Cuidado, descarte este item enquanto é tempo, pois a vingança é sempre câncer a roubar da vida a alegria que se quer viver.
É possível perceber que a mágoa compromete a vida ao roubar sua alegria. A lógica é simples, uma pessoa magoada busca se isolar, e isolada pode deprimir-se, deprimida não desfruta das cores trazidas pelo arco íris, e o cinza, apenas o cinza, fica a viver. Enquanto, quem perdoa é livre dos pensamentos negativos, tem a ansiedade e a angústia atenuada evitando de partir o coração, tem auto estima na medida que dá a si mesmo o olhar com bondade e treina a tolerância - capacidade de suportar o que não gosta no outro, se tornando capaz de manter as relações. Afinal, quem é que não precisa ser tolerado?
Quem chegar ao destino do perdão saberá que as dores vividas ‘produz perseverança; a perseverança, um caráter aprovado; e o caráter aprovado, esperança. E a esperança não nos decepciona, porque Deus derramou seu amor em nossos corações...5
E o amor, tão forte quanto a morte6 é a força necessária para suprir aqueles que decidem  viajar rumo ao destino do perdão, nesta fascinante saga que é a vida.

 Roseli de Araújo
Psicóloga clínica

Bibliografia
 1Girard e Mullet, 1998a; Mullet et al. 1998a
 2 Baltes e Smith, 1990
3 Mullet et al. 1998a,
4. e.g. Hebl e Enright, 1993
5. Romanos 5.3-5

         

segunda-feira, maio 28, 2018

O muro não terminado



Tomara que esse muro pintado pela metade, e não terminado, com a tinta e o pincel de cerdas grossas nele encostado, não seja parábola da vida.

Conta-se na mitologia grega, que Sísifo, rei de Corinto, após enganar duas vezes a morte, foi condenado pelo deus Zeus, a rolar uma pedra até o cume da montanha, porém, sempre que a pedra estava chegando lá, ela rolava montanha abaixo, e Sísifo tinha que voltar e levar a pedra novamente, e assim por toda a eternidade1. Triste sina!
Porém, diferente de Sísifo a rolar por toda vida a mesma pedra, parece que muitas vezes vivemos a maldição de rolar pedras novas, de projetos que nunca serão terminados, tornando-nos colecionadores de planos inacabados.
Entretanto, não é preciso muita alquimia para compreender a bruxaria... Os “coaches” do nosso tempo insistem que para quebrar esta maldição basta uma atitude, ter foco.
Mas, ter foco não é fácil hoje em dia. O mundo está povoado de distrações... E podemos nos tornar pessoas que tem na casa, no computador e na alma, uma despensa com as estantes abarrotadas, das paredes ao teto, por projetos incompletos.
Corremos o risco de não termos títulos em nossa biografia, nem diplomas na parede ou guardados em pastas. É que os cursos começados e não terminados, geram apenas os “mas” da lamentação. Na meia idade é difícil vencer o desânimo ao ver o dinheiro gasto, o tempo perdido, a energia gasta em algo que não se fez, a denunciar o desperdício.
Tantas vezes é possível ficarmos paralisados a olhar os projetos em vez de executá-los, gastando tempo, que não sabemos o quanto temos.
Cuidado ao esquecer a tinta encostada no muro ao lado do pincel de cerdas grossas.... Podemos estar vivendo uma maldição pior do que a vivida por Sísifo, a de não ter foco.
É mesmo lamentável tantos sonhos pela metade engavetados... A fazer correr pelos olhos da alma a tristeza do aborto de tantas colchas de retalhos, bordados, livros, desenhos, cursos, jardins, quadros, roupas, viagens, hortas, blogs...
Sísifo não tinha escolha, mas nós que pretextos temos?

 Roseli de Araújo
Psicóloga clínica
62 982385297


sexta-feira, maio 25, 2018

Nasce Neros



Os pais, sendo eles mocinhos ou vilões, são instrumentos para nos trazer a vida.  A vida é a nossa riqueza mais valiosa, o maior dom que recebemos, embora, anda meio desprezada hoje em dia.
Diante desta verdade, é fato que os pais nada devem aos seus filhos. Contudo, a crença de que os pais devam para os filhos a possibilidade de serem felizes é algo bizarro em nossos dias, porém tratado como o natural.
O trágico desta crença é que normalmente os pais não conseguem conceituar para si mesmo o que seja essa tal felicidade. E empurrados pelo visível mundo do consumo, ensinam seus filhos que são eles devedores de tudo o que o mercado lhes impõem. A consequência mais nefasta desta crença, são filhos cheios de direitos e vazios de responsabilidades. Coisa terrivelmente triste!
E pessoas com direitos demais pensa que tudo gira em torno delas. Se algo vai anti-horário do que deseja, debate-se em birra, até, em corredor de supermercado. Indivíduos com muitos direitos são melindrosos, se ressentem com o pouco... Nos pais avançam com tapas. Então, assistimos embasbacados a morte da noção de autoridade.
Os pais apatetados ficam, afinal, eles tornaram-se escravos dos filhos senhores, por concordar e ensinar aos filhos que eles merecem até o que não conquistaram.
Sofremos a olho nu a crise de autoridade, e tudo começou quando os pais deixaram de acreditar que são autoridade sobre a vida de seus filhos, tornando-se deles escravos, a trabalhar para sua felicidade, perdendo a função principal na vida deles, que é de ensiná-los o domínio das suas vontades.
E atônitos vemos nascer uma geração de Neros!!!  Gente capaz de matar os da própria casa para ter o que se quer.
É mesmo coisa terrivelmente triste!!!


quarta-feira, maio 23, 2018

Perdoar é preciso? IX



Perdoar os pais é necessário em algum momento?
Certa vez uma pessoa me confessou que odiava tanto sua mãe que nem o seu nome conseguia pronunciar, e se referia a ela como ‘aquela mulher’. Era triste e dolorido ouvir ele falar com tal raiva daquela que o gerou..., contudo, aquela era a sua realidade e infelizmente de muitas pessoas.
Entretanto, é fato que uma pessoa magoada com os pais pode perder a noção de quem ela é, e de como quer se construir. E na ignorância dela mesma, torna-se escrava, por tantas vezes, do que não quer.
É preciso crer que a relação não resolvida com os pais, refletirá em todas relações pela vida a fora. É comum mulheres que tiveram pais alcoólatras, buscarem homens que são abusivos no uso do álcool. É corriqueiro a procura por parceiros que tenham exatamente o que nos pais o desagradava.
Muito se fala sobre o assunto - é consenso entre Fé e Ciência – que a forma como vemos e tratamos nossos pais é o caminho que pode tornar possível a busca pela felicidade.
Diz a bíblia, (há mais de dois mil anos), “se alguém amaldiçoar seu pai ou sua mãe, a luz de sua vida se extinguirá na mais profunda escuridão”1. Na escuridão não é possível ver o caminho, logo, corre-se o risco sério de bater com o rosto na parede, de tropeçar, de quebrar coisas no caminho, de ser atacado por bichos.
E se os olhos não se acostumam com a escuridão para alguma coisa ao menos poder visualizar – a sensação é a perda total da direção - a luz da vida se acaba na escuridão. Instala-se na alma a angustia de viver a consequência de escolhas que nunca desejou. E a culpa, companheira amarga o torna escravo da sua dor.
Honrar pai e mãe, é na torá o primeiro mandamento com a promessa de vida longa e vida bem vivida. Honrar é um princípio de vida adotado por pessoas que reconhecem quem são os pais em sua vida, e a eles dão o lugar devido. Para estes, os pais são vistos como as pessoas mais especiais do mundo, não porque sempre acertaram, mas porque para eles, são pessoas as quais lhe deram a vida, e só esta razão é suficiente para que elas merecessem toda a sua consideração. É algo incomum atualmente, infelizmente..., mas, este é o caminho para se formar uma pessoa bem-sucedida na vida.
A psicologia (ciência com pouco mais de 100 anos), concorda, ao explicar por meio dos seus teóricos, que seja por qual for o motivo, a mágoa guardada dos pais, pode constituir em desajuste. Freud, um os mais conhecidos, fala sobre a importância do resgate simbólico dos pais em nós introjetado - guardado. Para ele, é preciso que haja conciliação simbolicamente com pai e mãe. E esta conciliação será possível quando o adulto buscar, não só justificá-los pela sua razão, mas num nível mais profundo, adentrar no inconsciente, resgatar a sua criança que está ferida, e que é manifestada, tantas vezes na baixa autoestima e arrogância, na falta de confiança na relação com o outro, na dificuldade em obedecer autoridades, na sensibilidade exacerbada, na falta de fronteira revelada no “sim” dito o tempo todo enquanto se quis e precisava dizer “não”.
Portanto, cuidado com qualquer mágoa trazida pelos pais, ainda que seja justo o seu motivo. Eles podem ter falhado em coisas as quais são indesculpáveis, tais como: Violência física, psicológica e pedofilia, ou com a indiferença, ou com a atitude de entregar você para que outros cuidassem, ou demonstraram amar mais seu irmão, ou tenham sido adoecidos emocionalmente, não conseguindo ver o que você tanto precisava, ou talvez eles tenham tido, por alguma razão mentes transtornadas pela herança genética, e como loucos foram conhecidos, envergonhando você.
Eles podem ter fracassado. Contudo, eles são humanos e errar é sempre uma possibilidade. Além disto, nesta vida nem tudo é escolhido, e existem coisas que são incontroláveis, como por exemplo, a genética herdada.
Seja como for... Seja o que for... Busque tratar a mágoa. Não importa que tamanho ela tenha, esta dor alimentada, será capaz de fazer com que a luz da sua vida se apague.
Talvez a dor já tenha se tornado indiferença em seu peito, talvez não veja nenhuma solução à vista, porém, não se conforme com esta tragédia. Se ela persistir, não se aceda, se por acaso tenha alguma fé no criador, clame com todo o seu ser, o poder para perdoar. Busque alguém em que possa confiar e confessar sua mágoa. E se isto não for suficiente procure ajuda especializada.
Seja como for... Seja o que for... Saiba que perdoar aos pais é sempre preciso. Ciência e fé já acordaram. Não se permita viver sem a luz que está, hoje, disponibilizada a você.
Roseli de Araújo
Psicóloga clínica
Contato 62-982385297

Referência:
1Provérbios 20:20

segunda-feira, maio 21, 2018

Então o futuro é isso aí?



E o presente,
A vida segue com suas pontuações ... ( ) ! : ;ou “ ”,  _?. E a vida insiste ... ;  , e _  “ ” ( ) ! : ? e.
E o olhar se perde nas mãos adormecidas, a sussurrar ao coração sem palavra alguma, que não há movimento que bombeia a vida. Vive-se só a angústia que paralisa. E do hoje, os passos... Sem ! .
E o futuro é isso ai?
No passado, uma expectativa de que o futuro seria bem melhor. No presente a certeza de que o passado foi melhor.
Então o futuro é isso?
O lugar que não se chega nunca?
Que pena que o coração não desconfia que de pique esconde, ele fica a brincar, no presente de todo dia.


Roseli de Araújo
Psicóloga clínica
Contato 62-982385297

sexta-feira, maio 18, 2018

Nem super bonder cola



A confiança quebrada é louça que nem super bonder cola.  Os pedaços se espalham pela sala, cozinha e quarto, a lembrar que o amor não está mais guardado.
 O abraço antes oferecido agora ficou para dentro. É que o coração ferido com o dito não cumprido, levanta muralhas sem brechas como as de um castelo antigo.
Melhor seria abandonar a justificativa do que já está desfeito, conchegando um gesto humilde de desculpa. Quem sabe assim a ira se despeça, e o amor seja mais uma vez recolhido, em sua forma de mais fina louça. 


Roseli de Araújo
Psicóloga clínica
Contato 62 982385297

quarta-feira, maio 16, 2018

Perdoar é preciso VIII?


É quarta. Eu sigo nesta estrada do perdão, e espero que até junho em consiga concluir.

Perdoar é preciso VIII

Perdoar está para as relações humanas como o respirar está para o corpo.  Sem perdão, o cenário das relações não se sustenta.
Porém, como um órgão do corpo que adoece, comprometendo todo seu funcionamento, pessoas que sofreram traição na relação conjugal, e que decidiram permanecer casadas, contudo, com uma mágoa camuflada, passam a viver um verdadeiro câncer emocional.
 Ainda que haja a confissão antes de ser descoberta a traição, ainda que a rival tenha sido abandonada, por mais que agora, o outro, oferte todo tempo disponível para refazer a relação, e daí? O estrago feito no coração não encontra consolo no arrependimento do que traiu. E sua mágoa não confessada é vista ao fiscalizar quase que diariamente o celular, o facebook e e-mail do cônjuge. Num gesto de quem não consegue se conter, ao final do dia, revista as roupas em busca de algum cheiro, de alguma cor de batom, de algum cupom fiscal... Sempre que supõe algo diferente, revira as coisas pessoais do cônjuge para ver se encontra alguma coisa incomum. Em sua cabeça, faz a conta do tempo, repassa a rota que o outro diz ter feito, e verifica o estepe do carro ao ser informada (o) que o atraso ocorreu porque o pneu furou.
Ao negar para si e para o outro que esteja magoada, mantém a cama como se nada tivesse acontecido, contudo, ao menor toque, seu coração grita, seria assim com a (o) outra (o)?
Na tentativa de controlar o insopitável, fica presa na guarita de proteção à vigiar o outro. Seu coração, outrora em paz, agora vive a guerra “invisível” da desconfiança.
E a angústia não se despede, ela vai comparecendo na lábil emoção que insiste em cristalizar outra forma na relação. ‘Será que estava com a (o) outra (o)?' No perdão, a afronta é relembrada sem roubar a calma alegre da alma, mas, na mágoa camuflada, o lembrar é obsessão que não dá folga, a dizer que está viva a raiva.
Jesus Cristo disse que a existência do divórcio foi permitida por causa da dureza do coração. Ao fazer tal afirmação, fica claro que ele conhecia bem a natureza humana, e dela não esperava nem mais e nem menos do que tinha para oferecer.
Jesus sabia que assim como o menor movimento do magma altera o cenário da terra, o coração humano ao sofrer o movimento do magma da traição, ainda que uma única vez, este deslocaria as placas tectônicas da confiança, mudando para sempre a relação. Ele disse, o coração do homem é duro. Sim! É pedra, é rocha que se modifica na amargura ao perder sua capacidade de seguir em paz.
Quem dera o coração humano fosse da dureza de um diamante, e, mesmo sendo arranhado pelas lapidações da vida, não se quebrasse as pressões vividas. Mas, ele pode ser rocha a se desfazer na dor gerada por uma traição, fazendo com que a possibilidade do deserto se instale.
E ainda que a pessoa tente se manter como se tudo estivesse como antes, a mudança que se fez no íntimo murmura, ‘não dou conta’. É que ao sentir o calor extremo da raiva provocada e o frio extremo da confiança desfeita, prova do destempero do deserto que se fez. Perde-se o equilíbrio.
Agora, o chão é areia a tornar pesada os passos da relação, e a pessoa não é capaz de oferecer ao traidor arrependido o perdão ao provar da sua mágoa velada.
Se há filhos, eles são os primeiros a perceber que a casa antes construída em rocha firme, parece agora, castelo de areia construído na praia enquanto a maré está baixa. É que as crianças sentem, ainda que nada saibam, que algo mudou a estrutura da casa.
É preciso coragem para não negar a mágoa. É na confissão feita a si mesmo que o primeiro passo é dado para encontrar o caminho para tratar o coração que se fez com a traição. Sem este passo, nada mais se fará.
Contudo, este é só o primeiro passo. A viagem poderá ser longa... Mas não desista! Vale a pena caminhar para ver o cenário novo que poderá nascer de um coração que se deixou tratar.
Quem sabe haja lugar para regeneração?
Quem sabe o coração tratado encontre no novo cenário que se formou, belezas antes não vistas?
Seja como for, para a paz, nós fomos chamados.
Roseli de Araújo
Psicóloga clínica
Contato 62 982385297






segunda-feira, maio 14, 2018


A magia da calma

A sala de espera estava um tédio. A vontade era de cruzar a porta... Enquanto o movimento da rua corria em meus olhos. Olhei para o relógio. Uma hora havia se passado e minha cabeça girou nas muitas atividades que estavam por fazer. Meia hora a mais... Ufa! O suor já escorria pela alma, e os pés em atitude de protesto, só se contentavam balançando.
Quando finalmente a porta do consultório se abrira, a minha indignação ocultada foi atrás de um sorriso sem olhar, curto e educado.
A consulta começou...
O homem imponente a minha frente, detinha uma voz e gestos tão serenos, que num “pirimplimplim” me fez esquecer o tempo não mais reconquistado. É mesmo fantástico o poder do encontro com o outro, ao desconstruir a construção que fiz em não estar ali.
E o tempo passou rápido... sai daquela consulta, e a rua antes sedutora, agora perdeu sobre mim o seu encanto. Estava admirada, e desejosa fiquei de aprender o feitiço que dentro de mim fez descanso.
Afinal, tive certeza, tem magia a calma!

Roseli de Araújo
Psicóloga clínica
Contato 62 982385297

sexta-feira, maio 11, 2018

Roupa velha



Confortável roupa velha! De tão rasgada, desbotada, já não serve mais para ir a outros lugares, contudo, a ela nos apegamos. Ao vesti-la somos repreendidos até pelo espelho. É que conforto demais sem beleza alguma começa a embaçar os olhos, mas, insistimos.
Não é fácil jogar a velha roupa confortável fora... Ainda que ela não nos permita ir em outros lugares, ainda que o tesão ela não mais provoca.
É preciso coragem para jogar fora a velha roupa, a ocupar um espaço no guarda roupa e no corpo, contudo, nem sempre sabemos onde encontrá-la. Às vezes, tenho a sensação que a roupa empina o nariz com o ar de soberana, a nos dizer que o seu destino é estar ali pela vida inteira. E agarrados a ela, concordamos que não deve ser mesmo descartada, porém, sem que perceba, abandonadas são as novas cores trazidas pelas estações da moda.
É mesmo confortável aquela roupa velha... O problema é quando a nossa alma a ela se afeiçoa... ai, ai, ai...  A escolher fica não abrir espaço para o novo. Acostuma-se a mesmice. Torna-se insistente a ver a vida passar até que a roupa velha se desfaça. Tomara que dê tempo de revestir o nu que se fará.


Roseli de Araújo
Psicóloga clínica
Contato (62) 982385297

quarta-feira, maio 09, 2018

Perdoar é preciso VII?


É quarta-feira, sigo falando sobre o perdão.



Certa vez uma colega contou-me que se arrependia muito do “sim” no dia do seu casamento. Esta, soube na semana próxima a cerimônia que não deveria se casar, mas não teve coragem de terminar o noivado. Os anos se passaram, e hoje casada, tantas vezes olha para o passado, a suspirar a angústia de uma relação, cujo os corações não se encontram. Na viagem da vida é sempre possível pessoas ficarem angustiadas por não terem obedecido o saber que sinalizou a melhor estrada, provando o terrível destino do “sim” quando gostariam de ter dito “não”. 
É possível também encontrar pessoas entristecidas por terem quebrado seus próprios princípios. Para estas, não há descanso, ainda que achem motivos que justifiquem suas escolhas. Ficam a repetir: o que fiz? Deixando de acreditar que ainda tem jeito, ainda há tempo, se tornando vítima da escolha que foi ré.
Há um outro grupo de pessoas que ao não encontrar razões em suas próprias razões, entra em um ciclo vicioso em que a culpa é alimentada.
E a culpa, companheira má, vai paralisando o aflito na medida que o prende ao seu passado, fazendo com que o passado ocupe o presente, de tal forma, que a pessoa perde a capacidade de ver o que pode ser feito no “agora”. 
Desconfio que a culpa é narcisa. Ela convence o réu a ficar com o olhar fixo no erro cometido, até que ele morra afogado na dor de não ter feito o que julgava certo, se tornando juiz implacável de si mesmo. Ainda que esteja arrependido, este não consegue encontrar o perdão que o libertaria, portanto, não aprendeu que na vida todos vão errar em alguma etapa. Todos terão que refazer a rota em algum momento da viagem, pois o GPS do coração não funciona de forma tão precisa. Todos.
E haverá momentos que se acreditará estar na direção certa, entretanto, logo à frente ou um pouco mais distante, este descobre que foi enganado pela sua percepção, ou pelo seu saber não sabido, ou pelas suas expectativas. Haverá momentos que se decidirá pela rota mais curta, até descobrir que não tem jeito de chegar no destino almejado. Haverá momentos, que a rota escolhida é a certa, mas, em um ponto do caminho, um desvio... não era isso que queríamos. Haverá momentos que a rota vai apresentando obstáculos tão grandes no decorrer do caminho que a opção é desistir ou desfalecer.
Todos erraremos em algum momento. Todos. Teremos que refazer a rota. Ninguém pode experimentar uma vida com paz e alegria acusando–se o tempo todo do que fez ou do que deveria ter feito.
Não se condena a falta de perdão o arrependido, ainda que este seja você.
Quem não perdoa a si mesmo, quem só enxerga os erros cometidos, vive o inferno do não recomeço.  Para estes, podemos apontar o perdão dos céus, entretanto, dizem não merecer. Se ofertado é o perdão dos humanos, desconfia da bondade por não conseguir ser bom consigo mesmo.
Então se você errou, assumas tua culpa, no entanto, não deixe ela adoecer você.
Pare com esta história de ficar brigando com o passado. Porque casei? Porque fiz este negócio? Porque não fui? Porque fui. Pare! Todo arrependido merece começar de novo. Aprenda que o erro assumido guarda a beleza da experiência. A experiência é a oportunidade da correção de rota para quem decidiu viver sem as lentes da acusação. Na vida é sempre possível refazer ou encontrar uma nova rota.
Então permita-se! Perdoe.
A viagem com destino ao perdão não deve ser feita apenas com o propósito de perdoar aos outros, se necessário, faça-a para perdoar a si mesmo.




Roseli de Araújo
Psicóloga clínica

segunda-feira, maio 07, 2018

Ela não foi plantada


Tem coisa que desafia. 


Esta semana percebi uma nova planta que nasceu na fenda do muro em meu quintal. Ainda que provocada a perguntar, como? A magia da beleza que nasce em lugar inóspito silenciou a lógica. 
Fiquei ali a pensar nos sonhos que não habitam o real... E me alegrei no olhar que não viu o processo do nascer e o romper de uma planta não regada.
Perdoe-me o olhar de criança ao voar para terra onde o possível se faz. Culpada foi esta planta ousada, a alargar no peito a esperança. É possível!
E minhas mãos feridas por tantas vezes fazer, e nada ver, se animam. Quem sabe nas fissuras nelas já produzidas, nasça o sonho que nunca deixou de existir.

 Roseli de Araújo        
 Psicóloga clínica
Contato - (62) 982385297

quarta-feira, maio 02, 2018

O perdão e seus mito(VI)

Oi gente, sigo falando sobre o perdão.


Quem já ouviu uma pessoa dizer que não conseguiu perdoar porque não conseguiu esquecer? É comum tal expressão, entretanto, o esquecimento é sintoma de doenças graves, e somente perdoamos o que podemos lembrar, logo, perdoar não é esquecer.
Agora uma coisa é certa, trazemos lembranças que não são lembradas. Sei que contraria a lógica tal afirmação, a qual, chamamos de paradoxo, no entanto, os paradoxos são mais comuns do que gostamos de imaginar nos humanos. E, Freud trouxe muita compreensão desta realidade, ao descobri o inconsciente, lugar que abriga as memórias trazidas e esquecidas (na linguagem psicanalítica, reprimida).
Recentemente, os estudiosos do cérebro mapearam a memória e descobriram que ela se localiza no lobo temporal, estrutura responsável pelo seu gerenciamento. Dentro dele existe o hipocampo, órgão que guarda as memórias a longo tempo e que faz parte do sistema límbico, região que regula as emoções. Muito há para desvendar, contudo, a ciência avança.
 É interessante que a memória e a emoção estejam casadas no cérebro humano, mantendo o registro dos fatos vividos com as cores das muitas possibilidades do sentir, seja susto, medo, vergonha, desamparo, e de tantos outros matizes.
É sabido que experiências vividas na infância que produziram traumas e dores não compreendidas pelo universo infantil, são muitas vezes escondidas do consciente, podendo a pessoa

 ficar sem lembrar do fato ocorrido por anos. E ainda existe a possibilidade de ter pessoas que nunca as acessarão.
E, ainda que pareça confortável não trazer na memória consciente a dor, as lembranças traumáticas podem produzir males psicológicos, como a ansiedade exagerada e a depressão.
Estas lembranças não lembradas, reclamam seu lugar, e se apresentam não só em forma de problemas psicológicos graves. Tais lembranças, por vezes, nos visitam com aquela tristeza sem motivo aparente, que se mostra numa tarde quente de verão, na praia. Outras vezes, se manifestam deixando o peito oco, a sentir um vazio na existência. Pode também comparecer numa irritabilidade que não se justifica. E seja como for que ela queira se mostrar, irá desgastar as relações vividas.
Estas lembranças surgem nas sessões de psicoterapia, mas elas também podem se apresentar quando ouvimos uma história, quando assistimos um filme, quando passamos por coisas semelhantes na vida adulta. Às vezes somos tomados por uma clareza súbita, e vemos o não visto.
Perdoar o que ficou guardado por tanto tempo é necessário, se um dia fomos feridos por pessoas que deveriam ter nos amado.
Se a mãe não se fez presente, se o pai abandonou, se a violência sexual o visitou, seja por meio de estranhos ou conhecidos, seja o que for que tenha nos machucado, é consenso que a estrada até o perdão pode ser obscura. Contudo, ele é capaz de nos tornar mais livres para vivermos com mais alegria.
Sei que esta caminhada exige por vezes uma força que pensamos não ter, mas, quem carregou uma dor por tanto tempo, tem muito mais força do que poderia imaginar. Talvez a coragem seja a virtude mais exigida. Encarar a criança ferida que um dia não deu conta da dor, acolhê-la, deixar a emoção correr pelos olhos, o corpo se balançar diante do vivido que não pode ser mudado, e em um gesto de fé, dizer, “eu perdoo”, só é para quem decidiu vencer o medo de não viver de verdade.
Há no confessar de uma intenção verdadeira, um poder que é liberado. E ao encontrar lugar de perdoar, e também de ser perdoado, seja pelos outros ou por você, a alma é tratada.
Perdoar não é esquecer, e tão pouco só lembrar, é também ouvir o grito desta criança que está dentro de nós. Ainda que isto signifique mergulhar no oceano profundo das nossas memórias, e deixá-la saber que agora tem um adulto que pode acalentá-la.

Roseli de Araújo

 Psicóloga clínica
 Contato 
62 982385297








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