terça-feira, abril 29, 2014

meu primeiro cartão


Escolher é sempre um desafio e este texto que apresento foi escrito durante minha graduação em psicologia e trata sobre as escolhas humanas na visão da Gestalt-terapia. 

Liberdade ou Desespero: A Escolha Sob o Olhar da Gestalt-terapia
Roseli Batista Sousa Barbosa de Araújo
Pontifícia Universidade Católica de Goiás

Na perspectiva existencialista a escolha é um presente dos deuses aos humanos que tanto pode ser benção quanto maldição, ao carregar em si a liberdade e a responsabilidade diante da qual ninguém pode se evadir, colocando na sorte ou nos outros, a culpa por suas desventuras. E dentro desta ótica, o decidir torna o ser humano responsável pelo que é, e mesmo quando não é aquilo que deseja, sempre é o resultado de suas escolhas (Sartre, 1970; Cardella, 2002: Manniom, 2005).
Angerami (1950) coloca que na percepção dos existencialistas a angustia é o “holo” da existência humana, é companheira eterna e interna de cada ser. E sendo o existir marcado por um emaranhado de situações escabrosas, só poderá se revestir de sentido na medida em o ser humano compreender que é livre para fazer suas escolhas ao mesmo tempo em que é responsável por elas.
Diante da liberdade de escolha o ser humano se angustia, contudo, sendo o detentor da primazia de acordo com a filosofia humanista, é superior aos animais ao se inquietar diante das suas realidades pessoais, ao viver em um constante estado de busca, condição que muitas vezes o leva ao desespero e faz com que almeje sempre superar-se e ir além (Kierkegaard, 1849; Mondin, 1980; Ribeiro, 2007).
Nesta busca da transcendência, a pessoa necessita trilhar pelo caminho das pedras e das belas paisagens que é o seu ser, precisa ter coragem de andar sem sinalização, e voltar-se totalmente para o seu mundo interior cavando de si mesmo, o que é, o que deseja, aonde quer chegar e como quer chegar; (Yontef, 1998; Cardella, 2002; Ribeiro, 2007 Rodrigues, 2009).
A Gestalt-terapia então nasce imbuída de cooperar para que o ser humano se conheça, e se embasa no Existencialismo e no Humanisno, afirmando que a pessoa por mais perdida que esteja em algum momento da sua jornada, possui uma bússola interna capaz de levá-la a rota certa, conduzindo-a por caminhos que a faça encontrar os seus recursos criativos, compreendendo a si mesmo e transcendendo os obstáculos, os sofrimentos, as limitações (Ribeiro, 1985; Zinker, 2001; Cardella, 2002).
Para encontrar seus recursos criativos a pessoa necessita trilhar pelo caminho das pedras e das belas paisagens que é o seu ser, precisa ter coragem de andar sem sinalização, e voltar-se totalmente para o seu mundo interior cavando de si mesmo, o que é, o que deseja, aonde quer chegar e como (Yontef, 1998; Cardella, 2002; Ribeiro, 2007 Rodrigues, 2009).
A Gestalt-terapia, imbuída desta tarefa de cooperar para que o ser humano transcenda, faz uso do enfoque dialógico, que busca compreender que as dificuldades da vida necessitam ser vistas como parte da saga de cada ser, como sinalizações do desequilíbrio das relações humanas, como um convite concreto para o abandono do olhar adoecido pelo egoísmo ao mesmo tempo em que retorna para relação com o outro, certo de que o adoecer é sempre fruto de um diálogo que não ocorreu (Hycner, 1995; Yontef, 1998).
A Gestalt-terapia então caminha de mãos dadas com a abordagem dialógica, que afirma que a existência humana é relacional. E nesta perspectiva duas atitudes são destacadas: o “Eu-Tu” e o “Eu-Isso”. O “Eu-Tu” aponta para um encontro, para o face a face com o outro, onde seguimos confirmando quem somos e descobrindo qual o sentido maior da existência humana. O “Eu-Isso” nos fala da relação utilitarista que é estabelecida com os objetos que podem ser conhecidos de forma objetiva (Buber, 1965; Malaghut, 1995; Cardella, 2002)
Na psicoterapia, o “Eu-Tu” é o conceito de fundamental importância para nortear a busca do terapeuta na disponibilidade para o outro, no contato e na confirmação da humanidade deste cliente que chega mergulhado no desespero que nasceu diante das escolhas que fez e, angustiado frente às escolhas que se apresentam no presente (Buber, 1965; Malaguth, 1995; Cardella, 2002; Yontef, 1998).
A relação terapêutica alicerçada no “Eu-Tu”, fará surgir o amor altruísta por parte do terapeuta, fomentará a cumplicidade, o encontro. De acordo com Petrelli (2001) o diálogo completo, que suscitará a importante confiança no cliente que está vulnerável por causa da sua dor. Levando-o a revelar seus sentimentos na medida em que andam lado a lado. E assim, através da auto escuta, fazendo contato consigo mesmo e com o outro, vivencie o que se apresenta no hoje, escolhendo para si o caminho a seguir (Zinker, 2001; Feldman, 2004; Ribeiro, 2007; Perls, 1997; Polster & Polster, 2001).
Para escolher é necessário considerar o “mundo” o qual o caminho se encontra, e a Gestalt-terapia ao evocar a teoria de campo e a teoria organísmica como parte dos seus pressupostos, torna-se detentora de refletores capazes de trazer luz ao cosmo do cliente, permitindo-o a vivenciar com mais clareza os potenciais e limites políticos, econômicos e sociais do seu contexto, bem como os seus próprios, levando-o a fazer escolhas mais ajustadas (Rodrigues, 2009).
 A Teoria de Campo parte do princípio que para compreender uma pessoa é necessário abarcar tudo que a cerca: seu ambiente, seus objetos, as pessoas que o compõem, assim como suas possibilidades e limitações (Kurt, 1965; Ribeiro, 1985; Yontef, 1998).
A Teoria Organísmica em seus apontamentos diz que a pessoa é uma combinação única e naturalmente organizada, no qual o todo que a compõe detém leis próprias que o regem, e que as partes são compreendidas como integrante do organismo total, não sendo possível jamais compreendê-las pela análise. Reflete também que a pessoa de forma permanente busca atualizar seu potencial que é inerente a sua natureza e, nesta empreitada se desenvolve enquanto ser (Ribeiro, 1985 p.107-108; Fagan & Shepherd, 1971).
A conexão entre estes princípios e a Gestalt-terapia é inegável, ambos defendem que a capacidade de “auto-regulação” é inerente ao ser humano, permitindo-o fazer escolhas que atualizem seus potenciais. Contudo, a confusão frente às escolhas que surge no campo a qual a pessoa está inserida rouba-lhe a ação imobilizando seu potencial na medida em que a desorganiza, e a psicoterapia deve ter como propósito situar o cliente quanto à direção dos seus sentimentos, discernindo qual o nível de energia possui para agir, e aonde quer chegar, o que facilitará certamente suas escolhas (Ribeiro, 1985; Perls, 1997; Rodrigues, 2009).
A ferramenta usada por psicoterapeutas da abordagem gestáltica para aportar o cliente a si situar em seu campo e a partir daí fazer suas escolhas, é o método fenomenológico. Este consiste em apreender a essência do que emerge a partir da descrição do fenômeno para atingir a realidade como ela é, alcançando o significado real do cliente, na medida em que investiga o que, o “como”, no “aqui e agora”, deste ser que é capaz de reconstruir-se a cada momento (Husserl, 2000; Ribeiro, 1985; Rodrigues, 2009; Ribeiro, 2007;).  Rohden (2007) ao apresentar a biografia de Einsteim nos conta que esse gênio afirmava que pensava 99 vezes e nada descobria, e ao deixar de pensar, a verdade se revelava a ele. Essa é a postura fenomenológica exigida para os gestalt-terapeutas. Despidos de qualquer juízo de valor devem trabalhar descrevendo o que se mostra - o fenômeno - se detendo no sentido do comportamento, captando assim todas as informações disponíveis e ajudando a pessoa a perceber seus sentimentos, seu ritmo, pensamentos e emoções, para que na medida em que entrar em contato consigo mesmo, vá se apropriando do poder que possui de gerir, através das suas escolhas, a sua própria história (Rodrigues, 2009; Cardoso, 2002).
De acordo com Fagan & Shepherd (1971) na medida em que uma pessoa “se identifica com os fragmentos alienados, ocorre uma integração” (p.112), pois ao ser o que é de forma plena, a pessoa pode se tornar a pessoa que quer ser.
Para a Gestalt-terapia, portanto, a pessoa só se identificará com seus fragmentos a partir da “awareness”, isto é, quando ela conseguir ter consciência do “aqui e agora”, do óbvio, da realidade que a envolve e do como ela se encontra frente a esse real (Yontef, 1987; Cardella, 2002). Diante desta realidade a “resposta consciente (como orientação e como manipulação) é o instrumento de crescimento no campo” (Perls, Hefferlin & Goodman, 1997, p.45).
O que permitirá a pessoa a vivenciar a “awareness” é a habilidade do terapeuta em levar o cliente a expandir suas fronteiras de contato, isto é, a experimentar e reconhecer suas possibilidades e limitações, a discernir o que é seu e o que é do outro, e a partir daí, escolher o que necessita para se ajustar criativamente. A expansão da “fronteira-de-contato” poderá capacitar o cliente a discernir o ritmo da música que se apresenta em seu campo, no tempo que se chama hoje, dando somente a ele, o poder de acertar seus passos (Perls, Hefferlin &Goodman, 1997; Yontef, 1998; Cardella, 2002).
Para a Gestalt-terapia, o processo terapêutico que permite a expansão da “fronteira-de-contato”, poderá levar o cliente “awareness”, ampliando sua percepção do que tem impedido o fluxo de sua vida e das situações inacabadas, para que fechando gestalts, abra-se para novas possibilidades que se apresentam no “aqui e agora”, deixando o passado no passado, e capacitando-o a fazer escolhas que venham a produzir o equilíbrio do seu campo (Yontef, 1998; Cardella, 2002).

Para os Gestalt-terapeutas o que interessa é a forma como seu cliente interage consigo mesmo e com o mundo a sua volta, o que ele vivencia e não o que fala, porque pressupõem que o seu funcionamento, sua forma de “ser-no-mundo” é que vai determinar o quanto saudável são suas escolhas (Hycner, 1995; Cardoso, 2005; Ginger & Ginger, 1995).