sábado, janeiro 23, 2016

O corpo que eu não vi

O corpo que eu não vi

O corpo que eu não vi foi o da pessoa mais amada, daquele que me trazia flores ainda que tivesse que dar uma pausa para comprá-la.
O corpo que eu não vi foi o que mais abracei com o amor eros, que me ensinou o confortante valor do abraço, foi meu suspiro, meu olhar completo.
O corpo que eu não vi se foi... não teve tempo de se despedir e partiu deixando como última lembrança o “eu te amo” sem nenhuma cobrança.
O corpo que eu não vi partiu cedo, ainda jovem, talvez pra concordar com Renato Russo, que os bons é na juventude que morrem.
O corpo que eu não vi me deixou o meu maior tesouro, meu filho, a quem a vida me trouxe, no tempo em que também fui feliz.
O corpo que eu não vi me trouxe a dor mais pungente, e o silêncio ante o mistério da vida e da morte... e fez surgir em mim uma ferida que só o tempo embalou, e que com o trabalho do Fiel Criador, curou.
O corpo que eu não vi me fez conhecer o mergulho no mar do vazio do nunca, que tem saudade que esmaga o peito, que tem amigos que se afastam, que tem preconceito antes nunca vivido, que tem homens que se aproximam com todas as intenções, que tem grupo que não nos aceita, que tem mulheres que agarram seus maridos com medo da nossa presença... ai, que mar difícil de mergulhar!
O corpo que eu não vi se desfez, mas aguarda aquele dia em que a morte será vencida.

E por isso, apesar de voltar à praia da vida, marcada por esse sofrer, sigo feliz.