Meu irmão Sandro, a quem amo demais da
conta, sempre dizia que eu andava com uma mochila nas costas. Quando é o Sandro
falando algo, temos sempre que buscar qual é o significado que está dando às
suas palavras, porque ele tem um dicionário exclusivamente criado por ele. “Mochilas
nas costas” significa que eu era uma sonhadora, dona de muitos projetos e
ideais que eu procurava realizar. Como líder de jovens e discipuladora, eu
estava sempre procurando algo novo para fazer, e naquele tempo eu esbanjava
energia, tempo e criatividade. Era “ligadona”.
Mas o tempo, esse que recebeu o poder de
ser soberano, passou. E a vida trouxe suas dores, e eu coloquei a mochila dos
sonhos no quarto de despensa da minha alma, como a gente coloca tranqueira em
quarto de despensa em nossa casa. E lá deixei a mochila por tanto tempo que até
quase me desacostumei de sonhar. Contudo, fui ficando cansada... senti que não
conseguia mais andar... pensava “Senhor, o que acontece comigo?”. E certa manhã,
lendo que Deus nos convida a encontrar descanso Nele, percebi que talvez eu
devesse estar com um problema muito sério. Deixa eu explicar: sempre que não
consigo viver como a Palavra diz, creio que o problema está comigo ou em outro
lugar, mas nunca em Deus. Aprendi que Seu caráter é bom, a despeito do que eu
vivo. Então comecei a orar... ah! esse negócio de orar funciona, mas
dói.
Fui percebendo que muitas das verdades que
eu acreditava, não eram verdade na minha vida. Fiquei abalada comigo. Que
distância é essa entre o que cremos e o que vivemos? Acho que a lua é mais
perto.
Então me rendi, aceitei, é isso que sou,
alguém muito longe de viver o que acredita. Mudei minha oração, passei a prestar
atenção em Deus, e dizer “estou aqui, não posso descansar, mas eu sei que tudo
podes, eu não posso nem ao mesmo sentir o que creio, mas eu sei que o Senhor
criou o mundo inteiro e isso é nada para o Senhor fazer”. Sentia-me humilhada
no início, com vergonha, como é difícil reconhecer quem somos, é uma dor que
não pode ser compartilhada.
E por muito tempo ouvi o silêncio de Deus.
E o tempo seguiu... sem perceber, de um
jeito que só o Criador sabe fazer, comecei a sentir Seus braços ternos me
envolverem. Ele me trouxe amigos, trouxe-me terapia, trouxe-me textos bíblicos,
palestras, Ele me trouxe trabalho, Ele me trouxe os sonhos de novo. E bem
devagarzinho a energia para viver voltou, e eu entrei naquele quarto para jogar
as tranqueiras fora, e descobri lá minha famosa mochila de sonhos que tanto meu irmão falava. E como uma criança diante de um brinquedo novo, abri correndo os seus
bolsos e vi os sonhos escritos, e me sentei no chão desse quarto, com o rosto
molhado em lágrimas e me recordei do tempo em que sonhar era um rotina diária.
E fiquei ali me perguntando se havia tempo para viver alguns desses sonhos, ou
se aquelas palavras antes escritas tinham se perdido no tempo. De repente, me
assustei, o que eu estou fazendo aqui, perdendo tempo?
E tirei os sonhos para fora, os que são
possíveis agora, e pus minha mochila nas costas...
E saí... confesso, agora, bem mais feliz.
Dessa mochila, hoje, retirei o meu livro,
que está aqui comigo, para ser corrigido e impresso. E em breve vocês pegarão
na mão um dos meus sonhos esquecidos.