segunda-feira, janeiro 11, 2016

O batom


De tudo que vivi ao lado da minha mãe quando ela amputou a perna esquerda, o que mais me impressionou foi sua postura após a cirurgia. Apreensiva entrei no quarto do hospital no dia em que recebeu alta com o coração tão pesado... como seria sua nova vida sem uma perna que carregou por tantos anos?
Porém, quando me viu, a primeira coisa que me perguntou foi:
Você tem um batom na bolsa? Não quero parecer doente.
Eu me assustei com seu pedido, esperava que estivesse tão apreensiva quanto eu com os olhares que receberia. Infelizmente muito preconceito se tem em relação ao deficiente físico, e meu temor era que as pessoas fossem inconveniente em seus comentários ou olhares. Eu não queria que ninguém a visse como se fosse uma coitadinha por saber da guerreira que está ali.
Eu estava armada, e custei a me desarmar frente aos olhares que ela recebeu, entretanto, ela saiu do quarto se despedindo das enfermeiras com os lábios rosados, um sorriso estampado e segurando um vaso de flores que ganhara de uma amiga que a visitou.
Eu não fotografei aquele momento, eu estava encenando no palco daquela cena, e naquele instante do espetáculo que eu temia, admirei a performance desta mulher surpreendente, que até então eu pensava conhecer sua força, e encantada com a leveza da sua bravura, minha armadura caiu... eu pensava conhecer a força desta mulher, mas descobrir que eu não a conhecia.